A Comissão de Juristas, instituída em 4 de setembro de 2023 pelo Senador Rodrigo Pacheco, sob a Coordenação do Ministro Luis Felipe Salomão, dedicou-se a propor modificações ao Código Civil. Após oito meses de debates, culminando em uma semana de deliberações, em 5 de abril de 2024, o projeto foi aprovado e encaminhado ao Senado Federal.
Como membro da subcomissão responsável pelo Direito de Família, sinto-me compelido a destacar, de forma resumida, as sugestões aprovadas. Neste contexto, é relevante tecer considerações sobre os pontos que representam avanços, retrocessos e omissões, delineando os aspectos que merecem atenção.
Direito de Família
Embora a subcomissão tenha aprovado a expressão “Direito das Famílias”, refletindo a abrangência constitucional do conceito, a proposta foi rejeitada sob a alegação de que a formulação “de” é mais inclusiva do que “das”.
Do Direito de Constituir Família
Em um passo significativo, o casamento deixou de inaugurar o livro que trata do direito das famílias, cedendo espaço a disposições gerais que delineiam as diretrizes fundamentais. Além de garantir o livre planejamento familiar, o projeto reconhece a dignidade humana, a paternidade responsável e a potencialidade da vida humana pré-uterina, bem como os cuidados com a gestante. O conceito de família abarca não apenas as constituídas pelo casamento e pela união estável, mas também as diversas estruturas de convívio entre parentes, refletindo uma evolução doutrinária e jurisprudencial.
Das Pessoas da Família
As relações de parentesco são nomeadas de acordo com suas origens, reconhecendo tanto os laços consanguíneos quanto os vínculos socioafetivos, de adoção e de reprodução assistida heteróloga. No entanto, ressalvas injustificadas limitam o reconhecimento automático de vínculos socioafetivos, uma lacuna que precisa ser abordada.
Do Casamento
O reconhecimento do casamento entre “duas pessoas”, em vez de “um homem e uma mulher”, consagra legalmente a união homoafetiva. Outros avanços incluem a eliminação das causas suspensivas do casamento, a simplificação dos procedimentos de habilitação e a dispensa de testemunhas e publicação de proclamas. No entanto, ressalvas quanto ao divórcio em caso de gravidez perpetuam questões como o casamento infantil, exigindo uma reflexão mais aprofundada.
Da União Estável
A regulamentação da união estável foi ajustada, mas a exigência de registro cria uma distinção entre uniões registradas e não registradas, gerando insegurança jurídica. A omissão quanto às uniões simultâneas reflete uma lacuna que favorece a desigualdade de gênero.
Da Convivência entre Pais e Filhos e o Exercício da Autoridade Parental
O capítulo sobre a convivência entre pais e filhos é crucial, mas a ausência de regulamentação efetiva compromete a eficácia das disposições constitucionais. A omissão em abordar a divisão igualitária dos encargos parentais e a chancela da guarda unilateral sucessiva representam falhas significativas.
Do Reconhecimento dos Filhos
O projeto avança ao admitir o reconhecimento do filho diretamente no Cartório de Registro Civil, refletindo a necessidade de promover a paternidade responsável. No entanto, a exigência de consentimento dos pais registrais para a adoção de maiores de idade requer uma revisão para garantir a proteção dos direitos dos filhos.
Da Socioafetividade
A positivação da socioafetividade e da multiparentalidade é um avanço, mas a demora na regulamentação extrajudicial reflete uma desconexão com as práticas atuais e os princípios de desburocratização.
Considerações Finais
O projeto do Código Civil apresenta avanços importantes, mas também revela retrocessos e omissões que demandam atenção. É fundamental promover um debate amplo e democrático para aprimorar as propostas, garantindo que o texto final reflita os valores constitucionais de dignidade, igualdade e solidariedade.
Fonte: Migalhas